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O Sexo e a Periferia

Entre a Carrie Bradshaw e a Bridget Jones. Com muito menos glamour, é claro.

Parece, segundo li, que Mercúrio retrógado terminou ontem (quantas vezes é que o raio desse planetinha vai andar pr'a trás?). Li também que ficará estacionado em Leão, "nos encorajando a falar com clareza e coragem". Até que não calhava mal! "A mudança de movimento de Mercúrio é especialmente relevante para aqueles de nós nascidos com planetas em signos fixos (Touro, Leão, Escorpião e Aquário) bem como Gémeos e Virgem". Espero que tenham apreciado a minha versão Maya. Estou calminha - não porque Mercúrio encontrou finalmente um lugar de estacionamento - mas porque... ora porque continuo a ter reacções diárias aos meus stories. Desde as primeiras conversações estabelecidas para a realização da cimeira do café (sem açúcar e sem cheirinho) que não há story que não tenha o dedo do menino. Não representa obviamente nada, claro, não pode, mas... segue atento, como eu o sigo a ele. Penso que ele ainda não se retirou das negociações. Vocês não imaginam como é rídiculo - e simultaneamente cómico - alguém com a minha idade adaptar-se a estas modernices. Uso pouquíssimo o face, prefiro de longe o instagram, mas só estamos "amigados" na primeira rede (ele nunca me adicionou no insta e eu também não o fiz, se bem que no insta eu tenho uma personalidade bem mais interessante, penso eu). Tive de andar a restringir metade dos meus contactos, imagine-se! Os stories precisam de ser cirúrgicos e não mal interpretados. Partilho basicamente quadros domésticos pouco comprometedores: paisagens da praia num dia de mergulho, as máquinas do ginásio num dia de treino, esse tipo de banalidades. Às vezes, mas só às vezes, o progresso dos treinos (uma pessoa não anda a lamber o chão para depois guardar os resultados só para si) e convenhamos: os homens gostam dessas coisas, somos todos muito visuais. Porque é que eu não hei-de celebrar isso? Uma foto do pump do treino (com a pessoa vestidinha, claro) é melhor do que uma frase feita. Ele costumava reagir bastante a esse tipo de conteúdos, agora que está "namorado", não sei. Testamos? Porque é que eu não hei-de me promover? Uma mulher bonita, inteligente, patroa, se ele não quer, pode haver outro que queira.

 

Esta experiência não deixa de ser um laboratório de inovação (como são todas as que nos permitem isso). Quando abri o facebook esta manhã, (tenho de abrir sempre por causa do trabalho), dei de caras com esta frase: "se você não está buscando um nome específico nas visualizações do seu story, seu equilibrio mental está em dia". Curiosamente o que me veio à mente foi isto: já estive dos dois lados e é uma tristeza, um autêntico deserto, não ter por quem procurar. Eu - que sempre me achei uma alma velha e solitária - à medida que a idade avança, tenho vindo a perceber que a vida tem muito mais graça ao lado dos outros e com os outros e os outros são naturalmente imperfeitos. Não quero com isto dizer que temos de fechar os olhos a tudo e mais alguma coisa; não, não é isso, mas temos de ter a capacidade de conseguir conviver com ambas as partes. Com as nossas também. Há 20 anos atrás eu não pensaria assim. Seria muito mais radical. Nunca teria olhado para ele nem lhe dado dois minutos da minha atenção (quanto mais a minha preciosa - ouvi esta referência num podcast com a Tânia Graça e achei delicioso). É preciso um jogo de cintura muito grande para praticar a aceitação, não é? É preciso também alguma maturidade. Levo um ano profissional do mais esgotante. Tive dezenas de situações caricatas com clientes e fornecedores, episódios desagradáveis que exigiram imensa energia para os gerir sem lhes endereçar um grande pirete em vez de melhores cumprimentos. Não imaginam como me sinto esgotada. Gerir um negócio e dar a cara por ele é das coisas mais duras que há. Quem está atrás de um balcão tem neste momento uma visão terrorífica da humanidade. Fui-me muito abaixo este ano. É por isso que as crianças são simples. Elas dizem o que pensam. E é por isso que o meu amigo, uma criança também, era um bálsamo. A vida para ele resume-se a coisas bem simples e eu aprecio muito as pessoas que trazem leveza e simplicidade à minha vida. Ao lado dele, eu não pensava muito. Conseguia desligar o quadro e baixar as luzes por um minuto. É raro isso acontecer, mas é muito bom quando acontece. 

 

Acho que sempre procurei simplificar as coisas a preto e branco e a verdade é que há imensos tons de cinzento nas nossas vidas. À medida que cresço tenho cada vez mais noção disso. Noção de que não posso continuar a polarizar o mundo em duas partes: os bons e os maus. É um ajuste directo dificil. Os novos discursos do amor próprio - que defendo a 100% - vieram impolar muito os extremos. Toda a gente é tóxica (o que não é mentira) e tudo o que te consome energia (não é saudável). Eu lido com muitos clientes dificeis, com gente com auras tão escuras que nem dá para ver bem de que cor elas são, mas se os enxotasse porta fora sempre que eles se aproximam de mim, estaria na falência (ou a trabalhar por conta de outrem e a queixar-me do patrão). Tento aguentá-los conforme posso, uns dias melhor, outros dias pior. Preciso deles assim como espero que eles continuem a precisar de mim (não todos os dias claro, mas quanto mais vezes, melhor). As relações não são um negócio, mas implicam trocas e paciência. Considero-me extremamente paciente, mas nas relações sou pouco tolerante. Ao minimo sinal de desconfiança, faço marcha atrás (tal como o raio do planeta). Uma amiga minha disse-me "o amor dá trabalho". Tudo o que dá trabalho assusta-me. Soa a mau, a esforço, a dor. Tenho tendência a descartar e a repelir. Depois olho para a quantidade de gente que aparece apaixonada, namorada, casada. Alguma coisa deve ter dado trabalho, não?

 

Estas férias - das quais já pensei desistir inúmeras vezes - vou tentar fazer isso. Vou abraçar um grupo novo (com imenso receio claro) e tolerar a vibe de uma amiga (com alguns defeitos). Não é má pessoa, nunca fez mal directamente a ninguém, mas se puder atirar areia para os olhos de alguém para se safar, é bem capaz disso. A típica chica esperta com a mania. Mente com os dentes todos que tem na boca e é sempre a vítima em todas as histórias que conta, mas também já me apoiou e ajudou - a mim e à minha família - numa altura em que precisei muito. Nunca me falhou, na verdade. O convite surgiu e como eu não tinha outras opções, aceitei. Já me arrependi, mas estou a tentar relativizar. É a oportunidade de conhecer um sítio onde sempre sonhei ir, portanto sorrir e acenar, sorrir e acenar. Tenho de contornar a tendência de olhar para tudo com desconfiança e desgraça. Talvez esteja a precisar de mudar a graduação das minhas lentes.

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