Eu rezo todos os dias de manhã. Não sei se as pessoas ditas católicas rezam como eu. Eu rezo como me ensinaram e como eu acho que deve ser. Um texto que acabou por se tornar muito meu depois de o repetir tanto. Disfarcei a minha fé durante anos. Não me digas que vais à missa? Vou. Na minha cabeça não faz muito sentido dizer que somos ou que fazemos sem praticarmos. Eu não anuncio o que faço ou sou capaz de fazer. Eu faço. Não me envergonha mais. Vou quando posso, quando sinto que preciso, quando encaixa no dia. A fé comove-me. A fé mais básica, mais pobre, mais deseducada. A fé despida de qualquer extremismo e de qualquer ostentação. O que é que eu peço quando rezo? O normal creio. Que não me aconteça nada de mal - nem a mim, nem aos meus - que eu saiba perdoar os erros dos outros e reconhecer os meus erros, que eu possa continuar a desenhar a vida com que sonhei, que eu continue a persistir nos dias de fraqueza e que só fiquem as coisas que são para ficar. Esta última parte tem sido a mais dificil de gerir. Eu quero muito que alguma coisa fique. Estou numa fase interessante da minha história, mas existem dias em que não deixo de pensar que o aeroporto da minha vida é um lugar duro onde se somam mais partidas do que chegadas. Está tudo bem. Menos nos dias em que é inevitável pensar nisso. Sinto que a dada altura do caminho me pregaram uma partida e me tiraram as rodinhas de trás. Roubaram-me coisas às quais tem sido dificil voltar, embora comece a achar muito piada a esta pessoa nova que se tem vindo a afirmar.
Hoje porque é o Thanksgiving - a única tradição que eu acho que realmente valia a pena importar dos EUA - em vez de pedir, agradeci. Agradeci tudo o que de fantástico me tem acontecido e acho que isso é sem dúvida uma das minhas maiores qualidades. Eu sou das que vê o copo quase sempre meio cheio (menos nos dias de TPM, claro). Talvez seja isso que os outros acham tão absurdo em mim. Como é que eu não sofro como era expectável sofrer? Os outros, na sua grande maioria os mais próximos. Os que deveriam supostamente celebrar-me. Eu sou a 2ª filha de um casamento que deveria ter acabado antes da 1ª. A miúda cheinha que só era popular na escola porque tinha boas notas. A adolescente que se inscreveu num curso que o pai não apoiava. A universitária a quem o 1º gajo com quem dormiu disse: "eu não estou apaixonado por ti e não quero continuar a ver-te". Alguém com 30s anos a quem disseram que era tudo mais fácil se morresse. Uma mulher com quase 40 a quem os médicos não aconselham ter filhos. Alguém que começou o próprio negócio aos 37 no meio de uma pandemia. Meus senhores, eu acho que tenho feito um trabalho hilariante com a minha vida. Quando me envolvi com este último rapaz das apps ele perguntou-me o que é que procurava, se era amor. Na altura, não soube responder. Acho que não. Acho que estou à procura de me sentir viva. De tudo o que me faça sentir isso. Um amor, um orgasmo, uma conversa, um passeio de bicicleta, uma tarde na praia.
Não aceito que me rotulem como "dificil". Tenho-me imposto nos últimos tempos. Ninguém goza mais com isso. Nem os de casa. Nem os de fora. Eu não sou "dificil" e mesmo que fosse, sê-lo não significa ser menos. Significa só ser diferente. Sou reservada, selectiva e solitária, mas não vejo isso como más qualidades. Sou o que sou e quem não gosta, que não estrague. Que diga só a verdade. E está tudo bem. Isto porque hoje apeteceu-me lamber-me o ego (já que não me lambem outras coisas). E agora vou ver sites e gastar dinheiro nas vendas antecipadas da Black Friday.